CONSUMIDOR LESADO EM SEUS DIREITOS NÃO
PRECISA COMPROVAR A CULPA DO FORNECEDOR PARA EXIGIR REPARAÇÃO.
Por ROSAURY F. VALENTE
SAMPAIO MUNIZ
O consumidor brasileiro possui uma Lei que prevê proteção e indenização
pelos abusos e lesões sofridas causadas por fornecedores. Entretanto, a Lei,
por si só não pode ressarci-lo dos danos que, por ventura venha sofrer. É
necessário que o consumidor busque o reparo amparado pela legislação
específica, no caso o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90.
Nas relações de consumo, havendo mais de um causador, os danos deverão
ser ressarcidos por todos, solidariamente, cabendo à vítima escolher contra
quem promover a ação de reparação se contra um, mais de um, ou contra
todos. O Código do Consumidor, no parágrafo único do art. 7º, aponta: "Tendo mais de um autor a ofensa, todos
responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de
consumo". O art. 25, por sua vez, estabelece, em seu parágrafo 1º: "Havendo mais de um responsável pela causação do dano, todos responderão
solidariamente pela reparação prevista nesta e nas seções anteriores"
[grifamos].
O referido parágrafo
único está justamente inserido de forma a representar o Código de Defesa do
Consumidor, em sua previsão legal, ao
mencionar que o causador do dano deve reparar a lesão independentemente de
culpa, nos casos previstos em
lei. Esta Lei , no presente caso, é justamente o CDC.
Ao contrário do que
exige a lei civil, quando reclama a necessidade da prova da culpa, na relação
entre consumidores esta prova é plenamente descartada, sendo suficiente a
existência do dano efetivo ao ofendido.
Isso porque, os
artigos da Lei assim o determinam. Vejamos:
“Art. 12. O
fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o
importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela
reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de
projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação
ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua utilização e riscos.” [grifamos]
Dessa forma,
constatado o fato que gerou o dano, proveniente da relação de consumo, e o dano
à parte mais fraca, caberá ao responsável, ou responsáveis, a sua reparação,
não havendo necessidade do consumidor apresentar prova da culpa.
“Art.14. O
fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de
culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos
relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou
inadequadas sobre sua fruição e riscos.” [grifamos]
Tais artigos, como
as demais normas previstas no código consumerista, visam proteger, de forma
privilegiada, a parte mais fraca da relação de consumo, visando evitar,
claramente, abusos dos comerciantes e fabricantes, ou prestadores de serviços,
estes visivelmente mais fortes em relação aos consumidores.
Não
obstante, o CDC, se apóia no Código Civil Brasileiro (CCB), podendo-se
confrontar o art. 389 do CCB, quando estabelece que “Não cumprida a obrigação, responde o devedor por perdas e danos, mais
juros e atualização monetária segundo índices oficiais regularmente
estabelecidos, e honorários de advogado”.
Assim sendo,
verifica-se que a Lei nº 8.078/90 estabeleceu a responsabilidade objetiva dos
produtores e fornecedores da cadeia produtiva, não levando em consideração a
existência da culpa frente aos danos provenientes de acidentes de consumo ou
vícios na qualidade ou quantidade dos mesmos ou na prestação dos serviços.
Nesse sentido,
acompanhemos o seguinte julgado do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul,
referente à venda de pacote de viagem de turismo:
“RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. LEGITIMIDADE. PRESTAÇÃO DE
SERVIÇO. PACOTE CONTRATADO JUNTO À AGÊNCIA AUTORIZADA. A legitimidade da
demandada resta configurada, ainda que a contratação do "pacote
turístico" se tenha efetivado por intermediação de empresa representante.
Contrato de prestação de serviços de turismo por adesão, no qual figura a demandada
como contratada. AUSÊNCIA DE REALIZAÇÃO
DE VIAGEM. INADIMPLEMENTO DO PACOTE TURÍSTICO. PREJUÍZOS MATERIAIS. ADEQUAÇÃO. DANO
MORAL IN RE IPSA. Caso em que a parte autora contrata os serviços de
turismo junto às demandadas não realiza
a viagem por circunstâncias imotivadas. A contratação do plano não permite
o seu cancelamento por normas internas posteriores à celebração da avença com o
consumidor. Dano material comprovado,
representado pelo desembolso do valor atinente ao pacote de turismo, que restou
inviabilizado. Valor adequado ao pleito inicial. Abalos extrapatrimoniais em decorrência da frustração de viagem
planejada. Dano in re ipsa. Ausente sistema de tarifamento, a fixação do
montante indenizatório ao dano está adstrita ao prudente arbítrio do juiz.
Valor mantido. Preliminar afastada e, no mérito, deram provimento em parte ao
recurso. Unânime. (Apelação Cível Nº 70042142604, Décima Câmara Cível, Tribunal
de Justiça do RS, Relator: Jorge Alberto Schreiner Pestana, Julgado em
26/05/2011)
Data de Julgamento: 26/05/2011
Publicação: Diário da Justiça do dia 10/06/2011” [grifamos]
O
ressarcimento ao consumidor lesado não se limita ao dano material, mas
estende-se ao dano moral, o qual decorre do princípio básico da
responsabilidade civil, de que a indenização deve ser a mais ampla possível,
abrangendo sempre todo e qualquer prejuízo.
A
reparação por dano moral constitui garantia constitucional prevista no artigo
5° - X, da Constituição Federal, onde lemos: “São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das
pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral
decorrente de sua violação.”
A reparação do dano moral, além de
encontrar acolhida na Carta Magna, encontra esteio, também, no Art. 927 do
Estatuto Civil, in verbis:
“Aquele que, por
ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a
repará-lo.”
Parágrafo único. “Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente
de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente
desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os
direitos de outrem.”
O dano moral, na
esfera do Direito, é todo sofrimento humano resultante de lesões de direitos
estranhos ao patrimônio, encarado como complexo de relações jurídicas com valor
econômico.
De acordo com o
magistério do clássico Wilson Melo da Silva, cuja definição de dano moral
dispensa quaisquer acréscimos ou comentários, temos:
“Danos morais
são lesões sofridas pelo sujeito físico ou pessoa natural de direito em seu
patrimônio ideal, entendendo-se por patrimônio ideal, em contraposição a
patrimônio material, o conjunto de tudo aquilo que não seja suscetível de valor
econômico. Jamais afetam o patrimônio material, como o salienta DEMOGUE. E para
que facilmente os reconheçamos, basta que se atente, não para o bem sobre que
incidiram, mas, sobretudo, para a natureza do prejuízo final.
Seu elemento
característico é a dor, tomado o termo em seu sentido amplo, abrangendo tanto
os sofrimentos meramente físicos, como os morais propriamente ditos.
Danos morais,
pois, seriam, exemplificadamente, os decorrentes das ofensas à honra, ao
decoro, à paz interior de cada qual, às crenças intimas, aos sentimentos
afetivos de qualquer espécie, à liberdade, à vida, à integridade corporal (MELO
DA SILVA, Wilson. O Dano Moral e sua Reparação. 2. ed. Rio de Janeiro: Forense,
1969. p.13-14).”
Hodiernamente, é
pacífico o entendimento de que o dano moral é indenizável, posto que qualquer
dano causado a alguém ou a seu patrimônio deve ser reparado. O dinheiro possui
valor permutativo, podendo-se, de alguma forma, lenir a dor pela indenização,
que representa também punição e desestímulo do ato ilícito.
No mesmo sentido, vejamos o seguinte julgado do Tribunal de
Justiça do Rio de Janeiro, in verbis
“0151827-12.2007.8.19.0001
(2008.001.65352) - APELAÇÃO - 1ª Ementa
DES. MILTON
FERNANDES DE SOUZA - Julgamento: 13/01/2009 - QUINTA CÂMARA CÍVEL
RESPONSABILIDADE
CIVIL. AGÊNCIA DE TURISMO. DEFEITO DO SERVIÇO. DANO MORAL E MATERIAL. 1 -O ordenamento
jurídico estabelece a responsabilidade do
fornecedor de serviços pelos danos causados aos consumidores, decorrentes
de defeitos relativos à prestação dos
serviços. 2- Nesse aspecto, o fato de se
gastar parte do tempo de viagem de lazer para resolver problemas de hotel,
cujos serviços não correspondem ao contratado com a agência de turismo, enseja
o advento de dano moral. Íntegra do Acórdão - Data de Julgamento:
13/01/2009.” [grifamos]
Portanto, comprovados os danos materiais e morais e o nexo causal de
forma inequívoca, ver-se-á, de forma translúcida, a responsabilidade civil objetiva e solidária entre as
contratadas, previstas no Código Consumerista Pátrio.
Ressalte-se que, em
havendo mais de um fornecedor, ainda que uma das empresas tenha ressarcido
parte do valor desembolsado pelo consumidor, não há que falar em reparação aos
danos causados, vez que resta a outra empresa, respondendo a primeira pela
inadimplência da segunda, haja vista a responsabilidade ser solidária. Ou seja, o fornecedor que pagou parte do
ressarcimento devido ao consumidor, continua responsável pela reparação dos
danos ainda não adimplidos pelas demais partes do contrato.
Vale lembrar que o
consumidor é a parte mais fraca da relação de consumo, senão financeira, o será
pelos conhecimentos técnicos e, ou, acadêmicos contratados. Lembremos, ainda,
que a condenação de um fornecedor à indenização ao consumidor pelos danos
sofridos, tem o caráter punitivo, a fim de evitar que a pratica lesiva alcance
outros consumidores, ou, até mesmo, se repita com o mesmo consumidor em outra
oportunidade.
[como citar este artigo]
MUNIZ. Rosaury F. V. Sampaio. Consumidor lesado em seus direitos não precisa
comprovar a culpa do fornecedor para exigir reparação Salvador,
29 jan. 2015. Disponível em: http://seudireitoaodireito.blogspot.com.
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