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quarta-feira, 2 de março de 2011

O ABOLICIONISMO ANIMAL - UMA ABORDAGEM REFLEXIVA



Matéria publicada no Jornal Aracaju Cultural
ano 3, número 27 25 de fevereiro a 25 de março / 2011
pagina 4



Este artigo trata de forma reflexiva sobre o direito à representação jurídica dos animais quando violados em seus direitos, como seres que coabitam o mesmo planeta que os “Homo sapiens sapiens”. Discute acerca do lugar servil que ocupa, da mesma forma que, ainda hoje é ocupado pela mulher, pelas negras e negros e indígenas. Questiona a não concessão de personalidade jurídica aos animais e a tutela constitucional que lhes é garantida como bem de todos.  

Apesar do momento histórico e civilizatório em que o homem está inserido, ainda permanece, de forma dominante, o entendimento de que os seres vivos, não humanos, especialmente os animais, devam ser utilizados para satisfazer os desejos e necessidades da espécie “Homo sapiens sapiens”.


É cediço que o homem e o animal têm em comum o ciclo vital, bem como as sensações de dor e prazer, sendo, no meu entender, ainda discutível, se o modo de agir do homem é, permanentemente, racional ou se o instinto característico de sua natureza animal não se encontra mais presente em suas ações do que a tão enlevada razão.


Ao fim e ao cabo, a aceitação dominante é de que o homem é o único ser pensante, o sábio (sapiens) e ocupa o ápice da grande cadeia dos seres, restando aos demais o lugar de servidão, sem direitos sociais, morais e jurídicos.


Tal lugar servil fora e, de certa forma ainda o é, ocupado pela mulher, pelas negras e negros e indígenas, apesar de toda a revolução impetrada em busca dos seus reconhecimentos como seres humanos dotados de intelecto e direitos dentro da sociedade, pseudo-civilizatória, remanescendo evidente e excludente a linha separatista.


Charles Darwin, com sua Teoria Das Espécies conseguiu provar a existência de uma continuidade entre o homem e as demais espécies animais, deslocando o homem da sua posição antropocêntrica. Contudo, tal teoria tem sido utilizada para ratificar a superioridade do homem e excluir as outras espécies da esfera de consideração jurídica e moral.


Cientificamente, tem-se comprovado que o homem é mais uma espécie na cadeia evolutiva e que as diferenças existentes estão no grau de evolução e não na categoria, haja vista a pequena diferença de 0,6% entre os códigos genéticos do homem e do chipanzé.


Em verdade, o homem ao se dizer ser sociável tenta fugir dos sentimentos instintivos próprios do ser animal, justificando seu comportamento violento e cruel com relação aos outros animais na sua forma de interpretação da teoria da seleção natural de Darwin.


A teoria de Darwin defende a sobrevivência dos mais aptos, por estes arregimentarem maior capacidade natural de adaptação às condições ambientais adversas. Certamente, Darwin, na sua teoria, não poderia ter incluído o homem armado de conhecimentos científicos e tecnológicos, lutando contra os demais seres e se declarando vencedor no mundo natural.


Trazendo tal discussão para o Direito, é sabido que os animais sempre foram considerados como coisas, inseridos no contexto da propriedade e da posse como bens móveis, daí a legalização do seu comercio como objeto das relações jurídicas.


Com efeito, o código civil de 1917 considerava como propriedade do caçador ou pescador o produto da sua atividade, podendo reivindicar a posse do animal caso sofresse esbulho.


Mais adiante é criada a Lei de Proteção à Fauna Silvestre, em 1967, que veda a caça e o comercio da fauna silvestre, mas autoriza a caça esportiva e cientifica e, o Código de Pesca, decreto-lei de 22 de janeiro de 1967, que permite a pesca profissional com fins comerciais, desportivos e científicos.


Com o atual modelo jurídico, os animais domésticos e domesticados, entre eles os destinados à industrialização de alimentos, são considerados bens particulares, sendo objeto de indenização por dano provocado por terceiro ou pelo Estado.


A Constituição de 1988 estabelece que o meio ambiente é bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, do que se depreende serem os animais silvestres pertencentes ao Estado, enquanto os domésticos e aqueles em que o Estado autoriza a apropriação, ao particular.


Eis que a Constituição de 1988, ao determinar que os animais silvestres, que antes eram tidos como “coisa de ninguém”, passem a ser bens de todos, nada acrescenta à garantia da integridade física desses seres, visto que além da caça e pesca autorizadas pelo sistema jurídico, os animais podem ser apropriados de forma clandestina e traficados de forma ilegal, diante a ausência de políticas públicas efetivas para o combate.


O fato de existirem leis proibindo atos de crueldade contra os animais não faz com que tais comportamentos sejam banidos, posto que ainda é massificante o entendimento de que os animais estão a serviço, de qualquer natureza, dos seus superiores – os homens.


Heron Santana, em seu livro Direito Ambiental pós Moderno, 2009, ao defender os direitos jurídicos dos animais, no entender da autora, o faz utilizando o comparativo negativo, quando questiona a concessão de personalidade jurídica a crianças por nascer e a deficientes mentais que levam uma vida vegetativa e não aos animais.


Com tal comparativo ele chama a atenção para a capacidade de sofrer dos animais como sendo a mesma que a de um humano, tendo este os direitos à dignidade preservados, ainda que impossibilitado, permanentemente de qualquer ação ou reação, exclusiva do ser humano.


Heron afirma a necessidade de igualdade dos direitos jurídicos dos animais e dos homens no que concerne ao direito à vida, proteção à liberdade individual e proibição de tortura, abolindo o aprisionamento em zoológicos, circos ou experiências cientificas ou industriais, tendo como base a capacidade de sofrimento, que em nada difere da dos humanos.


Segundo o citado professor, os animais devem ter a garantia do direito à representação em Juízo pelo seu proprietário ou pelo Ministério Público, da mesma forma que os incapazes, pessoas jurídicas e entes despersonalizados. O cerne da defesa impetrada por Heron se assenta na extensão dos direitos dos humanos aos animais e não na oposição destes à espécie “sapiens sapiens”.


Assim, ainda que tenhamos o amparo legal para banir a escravidão animal ou mesmo tutelar seus direitos, faz-se mister a compreensão de que estamos, também, tratando de cultura, que deve ser entendida como estruturante de indivíduos, transmitindo às gerações os valores filosóficos construídos a cada momento civilizatório e assumindo uma guerra, como a que travamos com relação aos direitos da mulher, dos afrodescendentes, indígenas e ciganos, nos nossos dias.


Entendo, por fim, que se trata de reconhecer a dignidade moral, justificando a proteção jurídica a esses seres que nos antecedem na escala evolutiva e são destituídos de atributos intelectuais e capacidade de sustentabilidade, sendo, portanto, vulneráveis, tal qual o são os incapazes, devendo ser protegidos e respeitados, apesar da capacidade destrutiva do homem, seres esses que existem, independentemente da vontade do sapiens.

Pós-graduada em Metodologia da Pesquisa e Extensão em Educação pela Universidade Estadual da Bahia; Graduada em Ciências Físicas e Biológicas, pela UCSal; Pós-graduada em Gestão pública com Ênfase em Planejamento de Projetos, pela Faculdade Kurius; Graduanda em Direito pela UCSal.