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domingo, 25 de dezembro de 2011

ALIENAÇÃO PARENTAL: UMA FORMA DE EXCLUSÃO DO DIREITO À FAMÍLIA



Rosaury Francisca Valente Sampaio Muniz

RESUMO: O trabalho focaliza a crise instalada, quando da ruptura das relações conjugais, como uma situação em que o guardião de uma criança ou adolescente as treinam para romper os laços afetivos com o genitor. Os sentimentos de ansiedade, temor em relação ao outro e o afastamento do genitor do convívio afetivo, interferem negativamente no desenvolvimento psicológico e social dos filhos, o que  caracteriza a Síndrome da Alienação Parental. O objetivo desta pesquisa é analisar a Síndrome da Alienação Parental, sua instalação, comportamento do alienador parental, efeitos da alienação parental, a lei nº 12.318/10 que trata sobre Alienação Parental e a Síndrome de Alienação Parental no Poder Judiciário. Mediante pesquisa bibliográfica e legislação específica, este estudo busca uma breve reflexão acerca da temática e suas implicações no âmbito da família e da sociedade.


PALAVRAS-CHAVE: Alienação parental; Família; Sociedade; Direito


INTRODUÇÃO

Com as transformações pelas quais o mundo tem passado, o traçado preciso que regulava o casamento perdeu a sua rigidez. A criação de um novo direito familiar, a ascensão da mulher a postos antes ocupados somente pelo homem e outros fatores externos ao casamento contribuíram para uma nova disposição, de certo modo, arredia quanto à visão ortodoxa de sociedade conjugal.

Essa sociedade, não diferentemente das demais, entra em crise, podendo desencadear a ruptura da relação entre marido e mulher, cujos efeitos se estenderão aos parentes, amigos e, principalmente, aos filhos, de forma a comprometer o grupo familiar.

Segundo Trindade (2004, p. 172), o litígio estabelecido entre o casal encontra dentro do âmbito jurídico, com a prolação da sentença pelo juízo, a sua resolução. Por outro lado, as questões de ordem afetiva e emocional, que têm sua gênese muito antes da contenda judicial, prolongam-se e repercutem no grupo familiar por mais tempo. Os processos jurídicos e psicológicos que envolvem as rupturas conjugais não são, necessariamente, paralelos, embora faça parte de uma mesma tessitura, razão pela qual o Direito de Família tem emprestado maior atenção às questões de ordem psíquicas.

O processo de desfazimento da vida conjugal gera, muitas vezes, um sentimento de abandono, rejeição e traição, convergindo para a vingança, em que o ex-cônjuge, aquele que detém a guarda, busca com a desmoralização, desqualificação e descrédito do outro, afastá-lo dos filhos.


Para tal, o cônjuge inconformado com a perda passa a dificultar o encontro dos filhos com o ex-cônjuge, criando e praticando estratégias que impeçam a relação, ao tempo em que constrói e implanta, na mente das crianças, a imagem de um pai ou mãe, que deverá ser rejeitada, instalando-se, a partir daí, o dano afetivo pela ausência de convívio com o pai ou a mãe, o qual é denominado de Síndrome de Alienação Parental.


SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL

A Síndrome da Alienação Parental (SAP) é o termo proposto por Richard Gardner em 1985, para a situação em que a mãe ou o pai de uma criança a treina para romper os laços afetivos com o outro genitor, como forma de vingança, criando fortes sentimentos de ansiedade e temor em relação ao outro.

Essa Síndrome situa-se na interseção entre o Direito e a Psicologia quando das dissoluções conjugais, em que os filhos e os bens patrimoniais são objeto de demandas e disputas judiciais, sendo tais disputas pelos filhos, muitas vezes, estendidas aos avós, quando da ausência ou morte  de um dos genitores.

No século XIX, quando os filhos e a mãe eram propriedades do varão e este detinha as melhores condições econômicas, presumindo-se que no caso de dissolução do casamento, também era o mais apto à guarda e proteção dos filhos. No século XX, o entendimento era o de que os filhos pequenos deveriam ficar sob os cuidados maternos, o que foi concluído pelas cortes americanas, na década de 70, como uma teoria sexista, entendendo, estes que a guarda deveria obedecer ao critério da capacidade parental, independente do sexo do genitor.

Já no século vigente tem-se um paradigma norteador do poder familiar assentado no melhor interesse da criança e na sua proteção integral, em que ambos os genitores têm a responsabilidade pelo cuidado, acompanhamento e educação dos filhos, conforme estatuem os artigos 1.630 e seguintes do Código Civil de 2.002 e o artigo 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente de 1.990.


ENTENDENDO A ALIENAÇÃO PARENTAL

Alienação parental é a rejeição do genitor que ‘ficou de fora’ pelos seus próprios filhos, fenômeno este provocado normalmente pelo guardião que detém a exclusividade da guarda sobre eles. Esta guarda única permite ao genitor que a detém com exclusividade, a capacidade de monopolizar o controle sobre a pessoa do filho, como um ditador, de forma que ao exercer este poder extravagante, desequilibra o relacionamento entre os pais em relação ao filho. A situação se caracteriza quando, a qualquer preço, o genitor guardião que quer se vingar do ex cônjuge, através da condição de superioridade que detém, tenta fazer com que o outro progenitor ou se dobre às suas vontades, ou então se afaste dos filhos.

Esse é um processo movido pela vingança, no qual após o desmoronamento da vida conjugal um cônjuge busca destruir os vínculos dos filhos com o outro genitor, usando de diversas estratégias para desqualificar o outro. Segundo Berenice Dias (2008, p.1), “o filho é utilizado como instrumento da agressividade direcionada ao parceiro. A mãe monitora o tempo do filho com o outro genitor e também os seus sentimentos para com ele”.

Levando em consideração que a guarda dos filhos é concedida às mulheres na maioria dos casos, salta aos nossos olhos que a maior incidência de casos de alienação parental é causada pelas mães, podendo, todavia ser causada, também, pelo pai, daí a conceituação defendida por Berenice Dias, exaltando a mãe alienadora, seguida da maioria dos estudiosos sobre o tema.

Já Podevyn, (2001, p.1) afirma que a “Alienação Parental é um processo que consiste em programar uma criança para que odeie um de seus genitores sem justificativa”, adotando uma definição sem especializar o sexo.

            Pode-se entender, ainda, a Alienação Parental como uma forma de maltrato ou abuso perpetrada pelo detentor da guarda ao destruir a relação do filho com o outro, assumindo o controle total, fazendo com que o filho o veja como um intruso, um invasor, caracterizando de forma cristalina a Síndrome da Alienação Parental (SAP) como


[...] um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a "lavagem cerebral, programação, doutrinação") e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável (GARDNER, 2002, p.2 ).


Por essa razão, faz-se mister o acompanhamento de um profissional da área da saúde mental para a  realização de um diagnóstico, que  assegure a inexistência do verdadeiro abuso parental, confirmando que o genitor alienado não mereça, de forma nenhuma, ser rejeitado e odiado por seu filho.

Em outra mão, uma vez detectada a existência do problema, este deverá ser tratado de forma individual, conforme nos esclarece Jorge Trindade (2007, p. 114), quando afirma que, “[...] a Síndrome de Alienação Parental exige uma abordagem terapêutica especifica para cada uma das pessoas envolvidas, havendo a necessidade de atendimento da criança, do alienador e do alienado”.


COMO A SÍNDROME DA ALIENAÇÃO PARENTAL SE INSTALA

Durante algum tempo, após a ruptura da relação conjugal, a guarda dos filhos era, naturalmente, função materna. Ao genitor eram permitidos encontros previamente estabelecidos, como: finais de semanas, comemorações natalinas e a passagem de ano, geralmente alternados, contabilizando um tempo muito curto para que houvesse o estreitamento e aprofundamento dos vínculos afetivos entre pai e filhos.

Atualmente, com as responsabilidades e os direitos compartilhados, o pai tem demonstrado, de forma ainda parcimoniosa, o interesse em participar, ativamente, da vida cotidiana dos filhos, algo impensável para a sociedade machista do passado, ganhando a mídia, por novidade que é a disputa judicial pela guarda dos filhos.

Então, começa uma guerra com o fim único de afastar o filho do seu genitor, executando manobras prazerosas, com o intuito de fazer o filho odiá-lo tanto quanto o outro, chegando a manipular situações que levem a crer que o filho está sendo vítima de abuso sexual pelo genitor que não detém a guarda.

Berenice Dias (2006) afirma que a criança não consegue distinguir entre a verdade e a mentira e finda acreditando naquilo que lhe foi insistentemente repetido. Interioriza as personagens criadas e, com o tempo, julga tê-las vivenciado, ao que se denomina de implantação de falsas memórias.

A memória pode ser entendida como sendo a capacidade de registrar, armazenar e manipular informações provenientes de interações entre o corpo, o cérebro e o mundo externo. É a base de nossos sentimentos e está fortemente relacionada com o aprendizado, vez que a memória resgata os conhecimentos aprendidos. Kandel (2009, p.27) diz que “[...] sem a viagem mental no tempo que a memória nos possibilita [...],não teríamos nenhum meio de nos recordarmos das alegrias que servem como marcos luminosos em nossas vidas [...]”.

            A criança construirá a sua memória, identidade pessoal e sexual a partir da relação estabelecida no convívio com os pais e a Alienação Parental que, contextualizada na raiva e desejo de vingança, afasta um dos genitores, dificultando essa construção. A memória, no entanto, pode ser manipulada e criada a partir de fatos ilusórios, levando a pessoa a crer fielmente que o fato ocorreu e, com seu douto saber, nos assegura Jorge Trindade (2010, p.203), que a Síndrome das Falsas Memórias,


[...] traz em si a conotação das memórias fabricadas ou forjadas, no todo ou em parte, na qual ocorrem relatos de fatos inverídicos, supostamente esquecidos por muito tempo e posteriormente relembrados. Podem ser implantadas por sugestão e consideradas verdadeiras e, dessa forma, influenciar o comportamento.


Assim, temos que a implantação de falsas memórias se consubstancia em importante mecanismo para conformação da Alienação Parental, perpetrada com o objetivo de aniquilar as relações afetivas entre pais e filhos.

Temos que o fenômeno da Alienação Parental não se materializa apenas com as atitudes dos genitores. Existem diversas ações judiciais impetradas pelos avós, pretendendo a guarda dos netos sob as mesmas alienações contra o genitor. Na ausência ou morte de um dos genitores, os avós ocupam a posição de alienadores, sustentando acusações de cunho sexual com o fito de destruir a personalidade do genitor e, conseqüentemente, a rejeição dos pais pelos netos, como poderemos verificar nos relatos de casos exemplificados mais adiante.


COMPORTAMENTO DO ALIENADOR  PARENTAL

            O alienador, ignorando e violando o princípio de que cada genitor deve favorecer o desenvolvimento positivo da relação entre os filhos e o outro genitor, põe-se  sob o falso  manto de protetor do filho,  não enxergando limites para corroer, seriamente, essa relação e se lança em uma saga de práticas e atos desarrazoados para obter a sua vitória.

Segundo Gardner (2010, p.1), pode se observar, com certa freqüência, os mesmos comportamentos no genitor alienador que sabota a relação entre os filhos, tais como:  recusar-se a passar chamadas telefônicas aos filhos; excluir o genitor alienado de exercer o direito de visitas; apresentar o novo cônjuge como sua nova mãe ou pai; interceptar cartas e presentes; desvalorizar ou insultar o outro genitor; recusar informações sobre as atividades escolares, a saúde e os esportes dos filhos; criticar o novo cônjuge do outro genitor; impedir a visita do outro genitor; envolver pessoas próximas na lavagem cerebral de seus filhos; ameaçar e punir os filhos quando se comunicam com o outro genitor; culpar o outro genitor pelo mau comportamento do filho; organizar várias atividades com os filhos durante o período que o outro genitor deve, normalmente, exercer o direito de visitas, dentre outros.

            Para o genitor alienador as regras foram feitas para os outros, não tem o costume de obedecer nem às sentenças dos Tribunais. Não é capaz de reconhecer que os filhos são seres individualizados e não enxerga, senão, a sua versão de todos os fatos. Frequentemente consegue convencer as pessoas que o cercam do seu desamparo e da sua hipócrita intenção em deixar que os filhos visitem o outro genitor e, via de regra, sua paranóia se estende aos que defendem o genitor alienado. Os comportamentos exemplificados, quando assiduamente verificados, representam um valioso conjunto de evidências na identificação do genitor alienador, caracterizando, assim, a presença da SAP.

As consequências à criança, segundo Trindade (2010), são depressão, incapacidade de adaptação a ambientes, tendência ao isolamento, desespero, comportamento hostil, falta de organização, tendência ao uso de drogas e álcool, chegando até a pensar em suicídio. Toda situação é criada pela construção de baixa estima, promovida pela falta de estrutura familiar.

Quando a Alienação não é abortada ainda na infância ou adolescência dos indivíduo, estes sobrevivem aos malefícios e conseguem, carregando as sequelas, chegar à fase adulta e descobrem que viveram enganados por um dos pais; sentindo-se cúmplices, voltam-s contra o enganador e se afastam, sofrendo novamente, agora pela culpa e orfandade, enquanto tentam recomeçar a sua relação com o ouro genitor, interrompida após tanto tempo.


 LEI Nº 12.318/10  -   ALIENAÇÃO PARENTAL

O tema em comento já vinha sendo avaliado e discutido na doutrina e na jurisprudência pátrias, carecendo, no entanto, de uma legislação pertinente. A Lei nº 12.318, que entrou em vigor em  27 de agosto de 2010, em seu parágrafo 2º, caput, cuida em definir a Alienação Parental, ipsis litteris:


Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. 



As disposições contidas na nova lei, em verdade, é remédio novo para antiga doença, mas que chega para amenizar, entre outros, o dilema vivido pelo magistrado, posto que:

[...] o juiz não tem como identificar a existência ou não dos episódios denunciados para reconhecer se está diante da síndrome da alienação parental e que a denúncia do abuso foi levada a efeito por mero espírito de vingança. Com o intuito de proteger a criança muitas vezes reverte a guarda ou suspende as visitas, enquanto são realizados estudos sociais e psicológicos. Como esses procedimentos são demorados, durante todo este período cessa a convivência entre ambos. O mais doloroso é que o resultado da série de avaliações, testes e entrevistas que se sucedem, às vezes durante anos, acaba não sendo conclusivo. Mais uma vez depara-se o juiz com novo desafio: manter ou não as visitas, autorizar somente visitas acompanhadas ou extinguir o poder familiar. Enfim, deve manter o vínculo de filiação ou condenar o filho à condição de órfão de pai vivo? (DIAS, 2010, p.2 ).

A Lei 12.318/10 elenca, de modo exemplificativo, diversas formas de ocorrência da alienação parental, como: promover campanha de desqualificação; dificultar o exercício da autoridade parental; omitir informações pessoais relevantes; apresentar falsa denúncia para obstaculizar a convivência; mudar o domicílio para local distante, sem justificativa e, dispõe em seu artigo 2º que:


[...] considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

O texto legal abordou os aspectos mais significativos da SAP, principalmente no tocante à criança e ao adolescente, visto serem as vítimas em potencial, posto que afeta diretamente a formação psicológica deles, ferindo o direito fundamental de convivência familiar saudável, conforme se pode verificar no artigo 3º da lei em apreço, in verbis:


A prática de ato de alienação parental fere direito fundamental da criança ou do adolescente de convivência familiar saudável, prejudica a realização de afeto nas relações com genitor e com o grupo familiar, constitui abuso moral contra a criança ou o adolescente e descumprimento dos deveres inerentes à autoridade parental ou decorrentes de tutela ou guarda. (grifamos) 


O legislador preocupou-se em elencar os avós como passíveis de incorrerem na prática da alienação parental, o que, conforme apontam os diversos processos em nossos Tribunais, é tema recorrente. Por outro lado, em seu artigo 2º, VII, expressa que dificultar a convivência com os avós é, também, forma de alienação parental, mas  deixou de prever a condição de alienados para eles, uma vez que tanto a doutrina como a jurisprudência enfatizam a necessidade dos laços afetivos com os avós, concedendo-lhes o direito de visita e, não raro, a própria guarda e tendo, ainda, o ônus das obrigações alimentares.

            Embora não cuide diretamente de proteger o direito dos avós contra a alienação parental realizada por quem detém a guarda dos netos, a nova Lei trata de uma adequação normativa ao contexto social, posto que as regras nela contidas já se encontram absorvidas pela doutrina e pela jurisprudência,

            Por outro lado, conforme ressalta Veloso (2010, p.1), esperava-se, na nova lei, “[...] mais medidas de prevenção e de tratamento dos entes envolvidos nesta síndrome, devendo ter mais instrumentos para prever e tratar comportamentos [...]” não se restringindo à repressão dos atos consumados ou em andamento e, almejando com isto o desestímulo às práticas alienadoras.


SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL NO PODER JUDICIÁRIO

Relato de Casos

As histórias acerca do fenômeno vêm sendo contadas no ambiente da Internet, através de blogs, sites de ajuda, artigos, jurisprudências e, também, livros, palestras, assim como  aulas ministradas nos meios acadêmicos.

Caso Lucila[1]

Lucila tinha pouco mais de quatro anos quando sua mãe ingressou com uma ação de suspensão de visita do pai à filha, cujo processo continha atestados em que médicos afirmavam que, no dia seguinte ao retorno da casa paterna, a menina estava com os genitais irritados, indicando a possibilidade de abuso sexual. A mãe, autora da ação, não acusava o pai de abuso, mas à companheira deste, que teria raspado a pomada de assadura com uma colher, ato este praticado de forma e com intenções libidinosas.

A mãe, além de falar com rancor da atual companheira do pai, afirmava sua falta de confiança, pedindo ao pai para que evitasse que a companheira atendesse a menina. O pai estava mobilizado, mas se mostrou disponível na avaliação, referindo confiança total na companheira, e relatando que delegava os cuidados de higiene da filha para esta, por entender que uma mulher cuidaria melhor de uma menina. A companheira do pai relatou que no período do suposto abuso Lucila já havia chegado assada, e ela apenas seguira o tratamento indicado pela mãe.

Lucila foi entrevistada a sós, numa sala com brinquedos. Comunicando-se bem e  aparentando tranqüilidade,  fez referências agradáveis sobre o pai, a companheira deste, e às atividades que faziam juntos, dizendo depois que não podia ir mais à casa do pai, seguindo, então, um relato idêntico ao da mãe acerca da colher, respondendo, ao ser perguntada  sobre o tamanho da colher,  que não sabia  por não tê-la visto, afirmando que foi a mãe quem contou o que aconteceu sobre tal fato. Encerrando a conversa, alegou já ter dito tudo o que a mãe combinou com ela sobre o que deveria ser dito.

Após o término da entrevista, a Assistente Social Denise Duarte respondeu: "Finalizamos o laudo sem ter a certeza quanto à veracidade ou não da alegação da mãe”.
Denise, então, conclui o caso: "Alguns meses depois, a profissional com quem Lucila foi fazer atendimento, nos telefonou e contou que a alegação era falsa, e, além da filha, a mãe também iniciou atendimento, estando restabelecido contato entre pai e filha”, restando claro que foi um caso  de Síndrome de Alienação Parental, envolvendo falsas memórias, e que se não fosse esclarecido em tempo o pai poderia ter sido completamente afastado.


Caso Victória[2]

Trata-se de recurso de apelação interposto por ATAÍDES S. e MARIA O. P. S., irresignados com sentença que, julgando conjuntamente dois processos em que contendiam com EDER A. L. pela guarda da infante VICTÓRIA C. (10 anos de idade), deferiu a guarda da menina ao pai.

Os avós sustentam que cuidaram da neta antes mesmo do seu nascimento, acompanharam a gestação, os primeiros passos e as primeiras palavras, sentindo-se aniquilados com a sentença que lhes negou a guarda da menina; afirmam, ainda, que jamais negaram ao pai o direito de ver a filha, mesmo que a tenha renegado enquanto estava na barriga da mãe e descurado nos seus cuidados, quando com ela esteve grávida, da mesma forma que fez com o irmão da menina, que veio a falecer, conforme provado na instrução. Dizem que se o pai realmente amasse a filha, não teria incomodado tanto a mãe, a ponto de lhe provocar um infarto, temendo que ele lhe tomasse a guarda.

 Afirmam, também, que a vontade da criança é permanecer com os avós e que não serão a psicóloga ou a assistente social, pessoas que mal a conhecem, que vão saber o que é melhor para menina. Acusam o pai de demonstrar obsessão pela guarda da menina, movido por interesses materiais e que Victória prefere ficar com os avós, por estes lhes dar maior segurança e responsabilizam o pai por ter provocado a animosidade entre as partes.

A sentença acabou por valorizar somente o depoimento do conselheiro tutelar, justamente favorecendo o pai e o parecer do MP culpa somente os apelantes (avós) pelas pressões psicológicas que a menina vinha sofrendo, prevendo que ela poderá ter problemas na adolescência.

 Os avós argúem em sede de recurso que o pai, na verdade, será o único responsável pelos problemas que Victória poderá ter, visto ser  desleixado, interesseiro e que quer demonstrar que tem força bastante para ganhar sua guarda “no braço”. Argumentam, ainda, que se é tão bom para a menina ficar com o pai, porque estabelecer um período de adaptação (?).

Em seu relatório, o desembargador Luiz Felipe Brasil Santos nega provimento ao apelo, mantendo a sentença nos seus exatos termos e pelos seus próprios fundamentos, invocando-os, também, como razões de decidir que a guarda de Victória ficaria com o pai, pessoa que lutou para ter consigo a filha e que tem todas as condições para educá-la e criá-la num ambiente afetivo e estruturado, que equilibre amor e limites, necessários para prepará-la e fortalecê-la para enfrentar a vida.

Embora compreensível o sofrimento e a irresignação dos apelantes por perderem a guarda da neta, as razões de apelação bem expressam o turbilhão de sentimentos vivenciados pela família materna da menina.

Numa mistura de mágoa e rancor, os apelantes assumem a posição de vítimas, procuram responsabilizar o apelado pelas mortes do neto e da filha, sem se dar conta de que, com isso, permitem que esses sentimentos negativos embotem o amor que sentem pela neta, transferindo para ela o peso de ser o único consolo dos avós velhinhos, a única coisa que restou da filha.

Victória é apenas uma criança, que não pode carregar a responsabilidade de ser, para os avós, a única lembrança da mãe e, com isso, ser levada a rejeitar o pai e vivenciar um conflito de lealdade extremamente prejudicial à sua formação e ao seu desenvolvimento emocional.

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Resta manifesto os malefícios promovidos pela Síndrome da Alienação Parental na família como um todo e, em especial, nas crianças e adolescentes, que são as maiores vítimas desses abusos, cujos indícios mais comuns são sentimentos de raiva em relação ao outro genitor, críticas constantes, distanciamento físico e emocional. Outro sinal importante, por parte do genitor que detém a guarda, são as manipulações que impedem ou dificultam o outro genitor de visitar ou manter contato com o filho.

A Síndrome da Alienação Parental, tendo sua pira na vingança, causa dores, sofrimentos e traumas e outras sérias conseqüências a todos os envolvidos, mas especialmente ao cônjuge alienado e à criança que, por estar em processo de desenvolvimento, não tem meios psicológicos para compreender e se defender dos abusos sofridos pelo alienador.

Mas, na verdade, uma grande parcela da responsabilidade, nos casos de Alienação Parental, recai sobre o Poder Judiciário, uma vez que as terríveis e danosas disputas findam, quase sempre, nas mãos dos magistrados, para uma decisão.

A Lei 12.318, indubitavelmente, instrumentaliza o Poder Judiciário para responsabilização do genitor que age alienando o outro, muito embora não cuide, expressamente, da prevenção e tratamento dos envolvidos, haja vista não ser a Alienação Parental um problema apenas dos genitores separados em litígio, mas acima de tudo uma patologia social, que deixa rastro e atinge as gerações futuras.

Portanto, urge uma conscientização da sociedade acerca da responsabilidade de pais, mães, avós e de quaisquer outros que exerçam a guarda de criança ou adolescente, e o entendimento que a estrutura familiar pode ser mantida de forma saudável, mesmo que os casais se separem, conquanto cada qual exerça seu papel de forma adequada e tenha a garantia do acesso a apoio especializado nos casos de inadequação às suas funções de guardiões.


REFERÊNCIAS
BRASIL, Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Acesso em: 17 nov 2010. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>.
BRASIL, Lei 12.318, de 26 de Agosto de 2010. Dispõe sobre a alienação parental e altera o art. 236 da Lei no 8.069, de 13 de julho de 1990. Acesso em: 17 nov 2010. Disponível em : <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/L8069.htm>.
GARDNER, Richard A.. O DSM-IV tem equivalente para o diagnóstico de síndrome de alienação parental (SAP)?Tradutor para o português Rita Rafaeli. Departamento de Psiquiatria Infantil da Faculdade de Medicina e Cirurgia da Universidade de Columbia, New York, New York, EUA, 2002. Acesso em: 17 nov 2010. Disponível em: .
DIAS, Maria Berenice. Síndrome da alienação parental, o que é isso? Jus Navigandi, Teresina, ano 10, n. 1119, 25 jul. 2006.

_________, Alienação parental: uma nova lei para um velho problema! Acesso em: 17 nov 2010. Disponível em:

TRINDADE, Jorge. Manual de psicologia jurídica para operadores do direito. Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2004.

Ibidem,  2010.

_________,. Incesto e alienação parental: realidades que a justiça insiste em não ver.  São Paulo, Revista dos Tribunais, 2007, p. 114.

PODEVYN, François. Síndrome da alienação parental. Tradutor para o Espanhol Paul Wilekens. Acesso em: 19 nov 2010. Disponível em: < http://users.skynet.be/paulwil/pas.htm>.

KANDEL, Eric R. Em busca da memória: o nascimento de uma nova ciência da mente / Eic R. Kandel ; tradução Rejane Rubino, São Paulo: Companhia
das Letras, 2009, p.27.

VELOSO, Genival de França.  Lei da alienação parental deveria prever tratamento da síndrome. Acesso em: 23 nov 2010. Disponível em: <http://ultimainstancia.uol.com.br/noticia/>





[1] VELLY, Ana Maria Frota. Alienação Parental: Uma Visão Jurídica e Psicológica. Acesso em : 18 nov 2010. Disponível em:   <http://www.ibdfam.org.br/?artigos&artigo=666>.
[2] EMENTA:  APELAÇÃO CÍVEL. MÃE FALECIDA. GUARDA DISPUTADA PELO PAI E AVÓS MATERNOS. SÍNDROME DE ALIENAÇÃO PARENTAL DESENCADEADA PELOS AVÓS. DEFERIMENTO DA GUARDA AO PAI. 1. Não merece reparos a sentença que, após o falecimento da mãe, deferiu a guarda da criança ao pai, que demonstra reunir todas as condições necessárias para proporcionar a filha um ambiente familiar com amor e limites, necessários ao seu saudável crescimento. 2. A tentativa de invalidar a figura paterna, geradora da síndrome de alienação parental, só milita em desfavor da criança e pode ensejar, caso persista, suspensão das visitas ao avós, a ser postulada em processo próprio. NEGARAM PROVIMENTO. UNÂNIME. (Apelação Cível Nº 70017390972), Sétima Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luiz Felipe Brasil Santos, Julgado em 13/06/2007. Publicação: Diário da Justiça do dia 19/06/2007.



Como citar este texto: NBR 6023:2002 ABNT
MUNIZ, Rosaury Francisca Valente Sampaio.  Alienação Parental: uma forma de exclusão do direito à família. Anais da XIV SEMOC - Semana de Mobilização Científica: O conhecimento no limiar do século XXI: 17 a 21 de outubro de 2011, Salvador. – Salvador: UCSAL- Universidade Católica do Salvador, 2011.2, CD-ROM-ISSN 2177-272X.